CRISTO REVELADO NO LIVRO DE HABACUQUE
Os termos usados em Hc em 3.13 ligam a idéia da salvação com o ungido do Senhor. As raízes hebraicas dessas palavras refletem os dois nomes do nosso Senhor: Jesus, que significa “salvação”, e Cristo, que significa “o ungido”. O contexto aqui é o grande poder de Deus manifestado a favor do seu povo, através de um Rei davídico, que lhes traria libertação dos seus inimigos. O Messias veio no tempo determinado (2.3; Gl 4.4), foi dado a ele o nome de “Jesus” como a profecia pré-natal de seu ministério (Mt 1.21), e nasceu “na cidade de Davi, o Salvador, que é Cristo, o Senhor” (Lc 2.11).
Enquanto Habacuque espera pela resposta à suas perguntas, Deus lhe concede o presente o presente de uma verdade que satisfaz suas ansiedades não-expressas, bem como apresenta a solução para sua situação presente: “O justo, pela sua fé, viverá” (2.4). O apóstolo Paulo vê essa afirmação de Habacuque como é a resposta para as necessidades humanas, incluindo a purificação do pecado, o relacionamento com Deus e a esperança para o futuro.
*Extraído da Bíblia de Estudo Aplicação Pessoal
Introdução ao Livro de Habacuque – A lógica teológica!
Não nos é revelado nada no texto sobre o profeta Habacuque. Seu livro, ao invés de guardar seus oráculos, serve como um diário de suas crises teológicas e existenciais. Seu livro é distinto dos demais escritos proféticos por assumir um tom mais filosófico e de diálogo com Deus. O tema deste diálogo filosófico se concentra em torno da justiça divina.
O vácuo de informações a respeito de Habacuque gerou uma grande gama de especulações sobre a data de seus escritos e a própria pessoa do profeta. O consenso geral é que Habacuque tenha pertencido à época do rei Jeoaquim (609 – 598 a.C.). Em virtude disso, seus questionamentos teológicos podem ser datados entre a ascensão de Jeoaquim ao trono de Judá e a Batalha de Carquêmis em 605 a.C.
Este período é escolhido em razão de:
- O caos ético e social que o texto de 1:2-4 apresenta combina com a decadência moral com os dias de reinado de Jeoaquim, conforme Jeremias denunciou.
- A proximidade da realização dos eventos descritos em 1:6-11, conforme a expressão “nos dias de vocês” no verso 5. Javé havia prometido a Josias que seu reinado não terminara com a invasão e cativeiro (2 Rs. 22:18-20). Talvez os oráculos de Habacuque se refiram aos últimos 20 anos de independência de Judá.
- A ascensão da Babilônia como superpotência mundial no século VII a.C. acontece no período previsto em Habacuque, embora isso não sirva como prova irrefutável.
O verso 5 ainda nos ajuda a definir esse período, pois, tendo o Egito como aliado, Judá dificilmente acreditaria que seriam vencidos pela Babilônia; o que de fato aconteceu quando Nabucodonosor derrotou o faraó Neco em Carquêmis (Jeremias 46:2,6,10; II Reis 24:7).
Alguns argumentam que as denúncias de injustiça de Habacuque não se encaixam no período de governo do rei Josias (pai de Jeoaquim), uma vez que este recebe uma avaliação tão boa. Entretanto, a reforma que o rei Josias fez, abrangeu apenas a parte litúrgica da sociedade hebraica, sem atingir a parte social. Por isso a reclamação de Habacuque acerca da injustiça não se choca com os relatos do governo de Josias, embora tenha tido uma boa apreciação. Além disso, os efeitos negativos dos cinquenta anos do reinado catastrófico de Manassés (avô de Josias) demorariam a desaparecer.
Habacuque baseou seus questionamentos em sua experiência com os eventos históricos de seu tempo. Tal qual Jeremias (Jr. 22:13-23), Habacuque também se indignou com a situação de injustiça, violência e opressão gritantes em Judá; por isso reclama para Deus pedindo o castigo para os maus e a defesa dos justos. A crise teológica de Habacuque começa justamente com o atraso do julgamento dos líderes injustos.
Habacuque fica espantado e confuso diante da revelação de Deus sobre a vinda dos babilônios como instrumento de Deus para o julgamento de Judá, ao invés de um discurso sobre a salvação ou livramento. O questionamento de Habacuque foi: poderia um Deus justo e bom usar meios perversos para executar sua justiça? (Hc. 1:12-17).
Estrutura de Habacuque
O livro de Habacuque pode ser dividido em diálogos da seguinte maneira:
- Diálogo 1 – Habacuque questiona a justiça divina – 1:1-11
- Diálogo 2 – Habacuque questiona a coerência divina – 1:12 – 2:20
- Diálogo 3 – Habacuque louva a Deus por suas intervenções na história – 3:1-19
O diálogo 1 começa com a reclamação de Habacuque a Deus sobre as injustiças que estavam à sua volta, e porque os perversos não eram julgados. Judá ainda não havia sido julgada por sua impiedade, e o primeiro alvo da queixa de Habacuque não é o povo, mas Deus (1:2-4). Deus então responde a Habacuque (1:5-11) dizendo que essa situação de opressão e injustiça não duraria muito tempo mais, pois, ainda nessa geração, os ímpios seriam castigados. Deus usaria a nação da Babilônia para aplicar o seu julgamento. Até este momento, as nações vizinhas eram alvo do castigo divino, e a surpresa de Habacuque reside no fato de Deus escolher uma das nações mais agressivas daquele tempo para executar seu julgamento contra Judá. Em vez de anunciar o livramento e restauração em forma de promessa, o livramento e a salvação viriam por meio do ataque de uma nação inimiga. Aqui, Deus não responde apenas ao profeta, mas a toda nação, conforme percebemos pelo emprego do plural.
O segundo diálogo propõe um problema lógico. Além de não resolver o problema da injustiça, as pessoas corretas seriam prejudicadas; e, ademais, um inimigo impiedoso seria vitorioso a despeito de ser castigado. Habacuque afirma a Deus que essa medida de julgamento não se ajusta com o caráter santo de Deus (1:12). Habacuque, embora soubesse das injustiças de Judá, achava que a perversidade dos babilônios era muito pior. Por isso se horroriza ao imaginar a destruição que os babilônios fariam em Judá. Habacuque os compara com um pescador inescrupuloso que pesca pelo simples prazer de matar os peixes. Outro problema de lógica levantado por Habacuque é em relação à soberania de Deus, que não interviria para proteger o seu povo. Habacuque não faz essa declaração de maneira leviana ou desrespeitosa, entretanto buscava sinceramente uma resposta. Deus responde que o julgamento se cumpriria e não procura defender sua justiça, mas afirma que o justo seria preservado (2:4). No NT Paulo usa este versículo para ressaltar a fé do cristão, contudo, no contexto de Habacuque, indica a integridade na vida do servo de Deus, mesmo que não consiga entender todo o processo. Deus prossegue em sua resposta apontando para a sua justiça, na qual o perverso é castigado.
Habacuque abre o terceiro diálogo expondo sua confiança em Deus, que a seu tempo castigaria o ímpio; e apelou à sua misericórdia na execução do julgamento de Judá. A consciência do verdadeiro relacionamento com Deus produziu o salmo de louvor registrado em 3:3-15, que descreve os feitos poderosos de Deus, não somente para julgar, mas também para livrar (3:13). Habacuque recorre à história de Israel comprovando sua obra redentora contra os inimigos do seu povo, fazendo um contraponto literário com a ameaça babilônica no capítulo 1. O livro termina com a confiança de Habacuque na justiça de Deus. Mesmo com tantas desgraças que viriam acontecer, a fé inabalável de Habacuque permitiu-lhe ter a alegria que não dependia mais das circunstâncias externas, mas do seu relacionamento verdadeiro com Deus.
Propósito e conteúdo
Habacuque trata sobre os seguintes temas principais:
- A justiça de Deus ao lidar com as nações
- A confiança em Deus a despeito das circunstâncias históricas
- O castigo de Judá por meio dos babilônios e o castigo da Babilônia
O império Assírio estava no domínio do Antigo Oriente Médio há mais de um século. Entretanto, começou a entrar em declínio, e Judá ainda não havia sido punida pela quebra de Aliança, conforme anúncio dos profetas. Esta foi a razão da queixa inicial de Habacuque. A resposta de Deus revelou que os babilônios seriam o instrumento do julgamento de Deus.
O problema, para Habacuque, estava na teodiceia, isto é, a justificação dos atos de Deus quando a humanidade sofre. Em nenhum momento Habacuque questiona o merecimento da punição de Judá; mas, se preocupa com a vitória dos babilônios em detrimento da ruína de Judá. De certa forma pareceria que Deus estava aprovando os métodos genocidas da Babilônia. Como Deus, sendo justo, poderia permitir que uma nação perversa prosperasse?
O problema em Habacuque gira basicamente em torno do mesmo tema de Jó. No final do livro que narra seu drama, Deus aparece para mostrar que a finitude humana não consegue dar respostas para todas as questões da vida; mas, Deus está presente em todos os momentos de dúvidas e aflição pelos quais a humanidade passa. Em Habacuque, a teofania do capítulo três tem a mesma função. Muito embora Habacuque não tivesse todas as respostas, a presença de Deus era suficiente para dar toda a confiança que o profeta precisava para aquele momento.
Contudo, em Habacuque, Deus revelou algumas respostas que serviram como eixo do livro. A primeira delas está em 2:4-5 e trata sobre a responsabilidade individual que não é descartada mesmo em caso de tempos sombrios. Nessas circunstâncias a confiança em Deus torna-se mais difícil e a fidelidade do justo adquire destaque.
A segunda resposta, encontrada em 2:6-20, Deus anuncia que castigaria os babilônios em virtude dos seus crimes contra a humanidade, mas ainda não havia chegado o momento. O fato dos babilônios serem o instrumento de Deus para o julgamento de Judá não significava que Deus aprovasse seus métodos. A certeza que Habacuque teve é que eles também seriam julgados, tanto por seus crimes de guerra, quanto pela impotência de seus deuses. O Habacuque entendeu naquele momento é que Deus governava o mundo e sua história a partir do templo; por isso, em virtude de sua soberania, todos deveriam calar-se diante dele (2:20).
O agir de Deus com as nações
No Antigo Testamento, as ações boas e más de todas as nações são pesadas. Quando o lado com as ações más atinge um determinado limite o julgamento de Deus é acionado. Cada geração contribui com as ações boas e más contrapostas umas às outras e retardam ou adiantam a execução do juízo de Deus. O arrependimento era uma forma de se retardar o julgamento, como se as ações boas fossem somadas diminuindo o limite das ações más (Jn. 3:10; 2 Rs. 22:19-20). A nação voltaria a enfrentar o risco de julgamento somente se voltasse a realizar ações más. O texto de Jeremias 18:7-10 exemplifica esse tratamento que Deus dava às nações.
Além desse aspecto do “peso” das boas e más ações a misericórdia de Deus tem um efeito mais prolongado do que seu castigo, de acordo com Deuteronômio 5:9-10. Outra característica de Deus em seu agir com as nações é que sua misericórdia, aplicada sobre o lado das boas ações retarda o julgamento pelas más ações, entretanto o peso das más ações não é eliminado até que o castigo seja aplicado. O texto de Êxodo 32:34 mostra como este princípio de aplica. Deus não puniu o povo naquele momento, por terem feito o bezerro de ouro em virtude de sua misericórdia. Contudo, chegaria a hora de serem punidos também por isso futuramente.
Ainda mais um princípio pode ser entendido. Os povos que contavam com a revelação de Deus, tal qual os hebreus, eram punidos com mais severidade em detrimento daqueles que não conheciam acerca de sua revelação indicando que a tolerância de Deus com os pagãos é maior. O Novo Testamento aplica esse princípio em Lc. 12:48.
Esse princípio pode ser aplicado a Judá. Embora os babilônios fossem realmente muito mais cruéis os israelitas deveriam ter sido mais obedientes em virtude da revelação da Lei e do aviso constante dos profetas sobre sua apostasia. Agora o momento da execução do castigo havia chegado.
Esse esquema só é atribuído às nações, não a indivíduos e não se trata de salvação. Por isso não há a preocupação de uma salvação baseada em boas obras.
A vida de fidelidade
Deus mostrara a Habacuque que, embora o castigo fosse severo, isso não seria o fim de Judá, mas haveria um remanescente preservado. O fundamento da preservação seria a fidelidade. No Novo Testamento, o apóstolo Paulo usa o conceito de Habacuque 2:4 para fundamentar a doutrina da justificação pela fé. Paulo cria uma ponte entre ‘emûnâ, que significa fidelidade e pistis, fé.
Em Habacuque a fidelidade, ou o posicionamento correto diante das circunstâncias adversas foi percebido por Paulo como o elemento universal de salvação, expresso mais claramente por Paulo em Romanos 8.
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