As Seitas Principais do Judaísmo
HASSIDISMO
Desde o
princípio houve duas correntes no seio do judaísmo: de um lado o formalismo
ritual da Bíblia e o Talmud e do outro, a tendência ao misticismo, ao ocultismo
que criou a Cabalá e o Zohar. Daí a oposição entre fariseus e essênios na época
do Talmud e entre talmudistas e cabalistas na Idade Média. O formalismo ritual,
tão rigorosamente praticado pelas massas do povo na Europa Oriental entre os
séculos XVII e XVIII, tendia fatalmente a produzir uma reação e daí nasceu o
hassidismo, isto é, o sistema de "hassid", que em hebraico significa
"pio".
Foi fundado no
ano de 1740 na Polônia pelo místico Israel ben Eliezer, conhecido pelo nome de
Baal Shem Tov: "o senhor de boa fama".
O
"hassidismo", que começou por abandonar o formalismo ritual,
despertou maior importância ao sentimento religioso que à prática. Proclamou a
onipresença de Deus e por isso ordenou que a oração fosse feita com devoção
psicológica e alegria especial, até chegar a um êxtase que permitia ao homem
entrar em comunicação direta com a divindade. Tornou sua a opinião da Cabala,
segundo a qual toda ação humana tem suas repercussões nas esferas do mundo
divino e assim o homem pio e justo, o "Tsadik", o ser que chega a
despojar-se de todo pensamento material e que vive nada mais que pelo espírito
e para o espírito, pode ser suscetível de modificar o curso dos acontecimentos.
Assim como o
"hassidismo" teve eminentes defensores como um Dov Beer, Levi Isaac,
Josef Ha-Cohen, etc., teve também grande oposição na pessoa do Gaón de Vilna e
os "masquilim", isto é, os simpatizantes da cultura moderna.
Seja qual for a
crítica que se haja podido fazer ao "hassidismo", este, segundo a
opinião de Edmond Fleg, devolveu à alma popular o sentido profundo do divino
que a casuística poderia ter lhe feito perder e deu à vida religiosa e social
do judaísmo, nos dois últimos séculos, a forma de uma grande originalidade que
inspirou a muitos escritores de valor.
ASHQUENAZIM
E SEFARADIM
Concluindo,
diremos algumas palavras sobre estes dois setores que formam o total do
conglomerado judeu do mundo: ashquenazim e sefaradim. Não o faremos analisando
a estrutura destes dois setores como grupos irreconciliáveis, tal como fizemos
com algumas seitas, das quais tratamos anteriormente. Não excluimos a
possibilidade de que em futuro próximo haja um franco entendimento entre eles,
que afaste todo o germem da divisão. Consideramos como muito provável, e nossa
esperança marca esta direção, que ambos os setores se unam e funcionem num
mesmo corpo. Nosso propósito é unicamente responder à nossa juventude, que a
todo momento nos pergunta: "Que significam os termos ashquenazi e
sefaradi? Quando começou a cisão? Por quê razões começou? Como poderia
chegar-se a uma junção entre os dois grupos? etc... etc...". É pois, para
dissipar as inquietudes de nossa juventude que tratamos deste tema:
1. - Ashquenazi: deriva do termo bíblico
"ashquenaz" (Gênesis, X 3), termo aplicado à Alemanha na Idade Média;
é pois um adjetivo gentílico que se traduz por "alemão", seu plural
hebraico é ashquenazim ou alemães, título dado ao setor representativo dos
judeus da Alemanha, setor que na Idade Média estava representado pelos rabinos
deste país.
2. - Sefaradi: deriva do termo bíblico
"sefarad" (Obadia 1, 20), identificado como Espanha, o que prova que
os profetas do exílio já tinham conhecimento de que um grande contingente de
judeus expatriados por motivo da queda de Jerusalém havia se estabelecido na
Espanha. O plural de sefaradi ou espanhol é sefaradim (espanhóis). Depois da
expulsão da Espanha e Portugal, estes sefaradim dispersaram-se pela Turquia,
Holanda, Itália, norte da África, etc.
Até a Idade
Média, não parece ter-se feito, em parte alguma, menção de ashquenazim e
sefaradim. Neste período da história o pensamento judaico viu-se dividido em
dois campos: de um lado, o rabinato do sul da França e Alemanha com Rashi, os
tossafistas, Rabenu Guershon, Meier de Rotenburg, etc., que se consagraram
unicamente à exegese da Bíblia, da Mishná e do Talmud; de outro lado, o
rabinato da Espanha que com a exegese dedicou-se a cultivar a filosofia, a
poesia, a gramática, etc.
Eram como dois
corpos distintos formados sob condições de vida diametralmente opostas: o
primeiro vivia perseguido e sob o feudalismo que apenas o tolerava, vivia sob o
terror de expulsões intermitentes que paulatinamente transplantaram esse setor
do judaísmo para Prússia, Polônia, Rumania, Galizia, etc. Foi sob a influência
rígida destes países que se forjou o pensamento escolástico e dogmático de suas
produções e suas obras. O segundo grupo vivia na Espanha em ambientes e
condições extremamente favoráveis que lhe permitiam desempenhar um papel
destacado em todas as atividades culturais.
De modo que,
para diferenciar os que pensavam, escreviam e trabalhavam sob a influência do
primeiro setor, chamou-se-lhes ashquenazim e aos do segundo setor sefaradim.
Mais tarde, tanto um como o outro nome foram aplicados a todos os judeus dos
dois setores. Posteriormente estas distâncias no pensamento se ampliaram até
chegar a diferenciar também algumas partes do mesmo ritual. Por esta razão
formaram-se dois ritos: Minhag Ashquenaz e Minhag Sefarad, que foram
definitivamente instituídos, o primeiro pelos rabinos Simhá de Vitri e Moisés
Iserles e o segundo por Rabi Amram Gaón e Rabi José Caro, respectivamente.
FARISEUS
Com este nome indica-se a seita mais importante que houve
no judaísmo do Segundo Templo. Sua origem é incerta; parece que derivaram dos
"hassidim", dos "pios" do templo dos macabeus e que
formaram sua congregação paulatinamente, apoiando sua fé, sua crença e seu
culto sobre a Lei Escrita e a Lei Oral, que os saduceus não aceitavam.
Não parece
exato que sua formação remonte ao ano 175 (A.C.), quando houve uma cisão no
Sanedrin. Suas doutrinas têm uma origem muito remota. Seus adeptos pertenceram
ao povo, ao contrário dos saduceus que pertenciam à aristocracia. Por haverem
saído dos fariseus todos os grandes doutores dos últimos séculos antes de
Cristo e primeiro depois de Cristo, doutores que criaram a Mishná e, mais
tarde, o Talmud, a seita dos fariseus foi a mais importante no judaísmo.
Politicamente foram favoráveis a qualquer forma de governo que não opuzesse
obstáculos ao seu culto. Suas doutrinas são praticamente as que chegaram até
nós através da Mishná e do Talmud.
Permitam-nos
abrir aqui um parêntese, não para fazer uma defesa ou apologia do farisaísmo,
mas para estabelecer a verdade histórica acerca desta seita, tão imerecidamente
combatida por alguns escritores sectários, para os quais fariseu seria sinônimo
de hipócrita e impostor.
Os fariseus
foram os continuadores da seita dos "hassidim" ou piedosos, formada
pelos mais renomados doutores do Talmud: Johanan ben Zacai, Rabi Aquiba, Simão
ben Yohay, Gamaliel, Hilel, Ben Azay, inclusive Saul de Tarso que mais tarde
trocou seu nome para São Paulo. Eram homens que cumpriam zelosamente não só as
leis escritas, mas também os costumes conservados oralmente. Distinguiram-se
por sua conduta moral e sua moderação na vida.
Deixaram
dispersos aqui e ali, no Talmud, numerosas máximas e sentenças dignas da
meditação de todo homem culto, sincero e imparcial. Citaremos algumas delas:
- "A verdade é o selo de Deus"
- "Mais que toda ação religiosa, Deus quer um coração puro"
- "Toda oração deve ser precedida por um ato de caridade"
- "Aquele que comete uma falta em segredo, nega a onipotência de Deus"
- "Se Deus reserva a recompensa das boas ações para o mundo futuro é com o fim de que os homens ajam neste mundo por convicção e não por interesse"
- "Sêde dos discípulos de Arão, amai a paz e sacrificai tudo para mantê-la"
- "Não julgues teu próximo até que te encontres no lugar dele"
- "Julgai todo mundo com indulgência"
- "Não envergonhai o próximo em público, porque isso poderia custar-lhe a vida e seríeis um criminoso"
- "Mais vale estar entre os perseguidos que entre os perseguidores"
- "Não te metas em nenhum assunto do qual possa resultar condenado à morte ainda que culpado"
- "Ditoso o homem que sai deste mundo, limpo e sem pecado, como entrou"Esta e outras centenas de máximas que o farisaísmo nos legou falam eloqüentemente da pureza de sua moral e de sua conduta e estabelecem irrefutavelmente que o sentido depreciativo que se lhe atribui não é outra coisa senão obra de quem estava interessado em caluniá-lo.SADUCEUSTambém para esta seita ou partido é difícil determinar a origem. Sabemos que existiu nos últimos dois séculos do Segundo Templo, em completa discórdia com os fariseus. O nome parece proceder de Sadoc, hierarca da família sacerdotal dos filhos de Sadoc, que segundo o programa ideal da constituição de Ezequiel devia ser a única família a exercer o sacerdócio na nova Judéia. De modo que, dizer saduceus era como dizer "pertencentes ao partido da estirpe sacerdotal dominante". Diferiam dos fariseus por não aceitarem a tradição oral. Na realidade, parece que a controvérsia entre eles foi uma continuação dessa hostilidade que havia começado no templo dos macabeus, entre os helenizantes e os ortodoxos. Com efeito, os saduceus, pertencendo à classe dominadora, tendo a miudo contato com ambientes helenizados, estavam inclinados a algumas modificações ou helenizações. O conflito entre estes dois partidos foi o desastre dos últimos anos da Jerusalém judia.Suas doutrinas são quase desconhecidas, não havendo ficado nada de seus escritos. Com muita probabilidade, ainda que rechaçando a tradição farisaica, possuiram uma doutrina relativa à interpretação e à aplicação da lei bíblica. O único que nos oferece alguns dados sobre suas doutrinas é Flávio Josefo que, por ser fariseu e por haver escrito para o público greco-romano, não é digno de muita confiança.Parece provável que as divergências entre saduceus e fariseus foram mais que dogmáticas, foram jurídicas e rituais. Com a queda de Jerusalém, a seita dos saduceus extinguiu-se. Ficaram porém suas marcas em todas as tendências anti-rabínicas dos primeiros séculos (D.C.) e da época medieval.ESSÊNIOSUma das seitas importantes no período do segundo Templo era a dos essênios. A origem do nome não é muito segura. Há quem o ligue a raízes gregas, aramaicas ou hebraicas, mas na realidade seu significado é obscuro. Pelo que se sabe de suas características, o significado mais apropriado seria o de "puros" ou "pios".O essenismo constituiu, nos séculos que vão desde o ano 150 (A.C) ao 70 (D.C.), uma comunidade religiosa judaica que tinha algumas características essenciais que afastavam-na do Templo de Jerusalém. As fontes que temos encontram-sem em Filon e Flávio Josefo. Parece que os essênios viviam, de preferência, nas planícies e que uma de suas principais sédes estava instalada no oásis de En-guedi sobre o Mar Morto. Constituiam sobretudo uma ordem monástica; não se casavam e sua comunidade perpetuava-se somente com a associação de novos membros. Não procuravam lucros pessoais, todos trabalhavam pelos congregados, com os quais viviam em comum. Para ingressar na confraria deviam passar por diversas fases de noviciado; por sua sinceridade consideravam reprovável o juramento; seguiam rigorosas regras de pureza tomando banhos freqüentíssimos e usavam trajes brancos.De sua teologia e de suas doutrinas se conhece muito pouco. Não se sabe se tiveram outros livros sagrados além do Pentateuco. Parece que a idéia que eles tinham sobre a imortalidade limitava-se a considerar que a alma veio do céu e a ele volta depois da morte do corpo, se o mereceu. Presume-se que atribuiam muita importância à magia e à arte de prever o futuro. Consideravam um dever mostrar-se fiéis à autoridade nacional constituída, mas não à estrangeira. Com efeito, no ano de 66 uniram-se aos celotes na revolta contra Roma.Tinham algumas particularidades que os afastavam do Templo de Jerusalém; a abstenção do matrimônio, a abstenção dos sacrifícios ensanguentados e o rito da prece olhando o sol. Estes elementos são, na realidade, estranhos ao judaísmo e parecem haver chegado ao essenismo por via sincrética, aproveitados de tantas religiões que corriam pelo Oriente. Não se pode determinar com exatidão se neste sincretismo intervieram a órfica, o helenismo em geral, o budismo ou o paganismo sírio-palestinense.Parece muito provável que o essenismo contribuiu não só para o advento do cristianismo mas também para a sua difusão. Na realidade, as distintas seitas judeu-cristãs apresentam muitas afinidades com o essenismo.
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